sexta-feira, maio 11, 2007

para a Bri e demais interessados

Ao pedido de um amor incondicional tenta-se responder (quase) imediatamente. Então vejamos se consigo pôr-vos a par do que se tem passado em Tallinn e na minha cabeça na última semana.
Depois dos motins (26 e 27 Abril) o ambiente na cidade ficou muito estranho, pesado, muito azul escuro. Mas, tínhamos algo mais importamte com o que nos preocupar: a festa de despedida do Christian. Para mim, ir pô-lo ao aeroporto significou o início do fim do meu SVE. Já alguns voluntários partiram da Estónia rumo às suas casas. Não vou dizer que não fiquei triste, mas, o Christian foi o primeiro do núcleo duro a partir. E foi muito duro vê-lo desaparecer por entre as portas de segurança. Apesar dos balões, chapéus de festa e cartazes, foi a choradeira pegada, principalmente para mim. Foi dia 4 de Maio. Dia 4 de Julho é a vez do Kêlig, Laura e Aude. Entretanto vai a Alice, o Georgios e a Lesya… em menos de dois meses o meu núcleo duro ficará reduzido à Julka e ao Thomas. Já tinha pensado nisto várias vezes, mas quando estava no aeroporto desabou sobre a minha cabeça a realidade implacável: “vais ficar sem amigos, outra vez”!
Claro que, quando me vim embora de Portugal, também chorei por deixar os meus amigos e família. Mas sei que em Dezembro, no máximo, os vou rever. Sei que quando voltar tudo estará na mesma. A minha irmã mais nova estará uns centímetros mais alta, talvez a minha avó tenha uns cabelos brancos a mais. Certamente os meus amigos terão empregos diferentes, roupas novas, estranhos amores. Mas sei de fonte segura que tudo estará basicamente na mesma. Por isso é “fácil”, more or less.
Com os amigos que fiz aqui (sim, alguns serão amigos para a vida, sinto-o) a coisa muda de figura. Malta que mora na Rússia ou na Ucrânia, dificilmente, voltarei a ver. Não sei que caminhos tomará a minha vida e a deles, mas… O Christian mora em Itália, o Kê, Alice e Aude em França, a Laura em Berlim. Não deve ser tão difícil voltar a vê-los, mas mesmo assim… Bem, com tudo isto só quero dizer que em Julho e Agosto o meu coraçãozinho vai andar feito em pantanas… Claro que novos voluntários vão chegar, quem sabe um príncipe virá no meio deles… But I don’t care, because they are not THE volunteers. The ones that shared with me my first moments, my doubts! I’m afraid!!!
Como: “What goes around comes around” o Christian teve direito a uma super festa de despedida. Alugámos sala especial da African Kitchen, com direito a sauna e tudo! Toda a gente cozinhou qualquer coisinha, comprámos vinho, cerveja e vodka, pusémos os bikinis e lá fomos para a festa mais triste de sempre! Não tenho muitas fotos dessa noite, pois como devem imaginar a minha disposição não era a melhor.
Vse kogda-nibud budet horosho. (tudo vai ficar bem, um dia. Comentário gentilmente cedido por Julka Kazakova)
Além disso, antes da festa, exactamente antes de sair do escritório, tive uma pega descomunal com os meus patrões. Como vocês sabem na semana passada houve duas noites de motins. O que não sabem é que na manhã de 27 de Abril, um dos miúdos da nosa organização foi preso, on his way to school. Na primeira noite de motim, o chavalo não saiu de casa. Foi preso às 9h30 da manhã do dia seguinte. Está a ser acusado de organizar o motim… na sua casa, a polícia confiscou material anti-fascista e cenas relativas a um projecto (“School of Democracy”) da nossa organização. Grande confusão, grande alarido… Entretanto, o tribunal deu ordem para manter o chavalo em cativeiro até seis meses, se necessário. Escusado será dizer que, na minha opinião, o miúdo não tem capacidade para organizar uma festa, quanto mais um motim. E se bem me lembro da definição de motim, uma das características deste ajuntamento de pessoas é a imprevisibilidade e a desorganização…
Então na quinta-feira, dia da festa do Christian, a Maia e o Igor decidiram chamar-me à razão porque eu não faço nada pelo chavalo que foi preso. Os textos que escrevi sobre os motins classificaram-nos como “showing no emotion, no opinion”… E pronto, foi caldo entornado! Anda uma gaja 5 anos a estudar na faculdade, a aprender a pôr sentimento e opiniões e lado quando escreve um texto jornalístico para depois ouvir uma merda destas! Como o meu humor não era o melhor, colei o ponteiro e mostrei-lhes os dentes! Quem me conhece bem sabe do que falo.
Erro número dois: pediram-me para escrever um artigo de opinião, sobre o ponto de vista de um estrangeiro residente em Tallinn… Quem trabalhou comigo n’A CABRA sabe bem o que me custa escever este tipo de artigos. Sempre me recusei até à última e desta vez não foi excepção. Disse-lhes claramente que a minha opinião é minha e só minha. Só a partilho com amigos e desconhecidos que viajam no meu blog. Não é publicável em nenhum meio de comunicação russo ou estoniano, PORQUE EU NÃO QUERO!! Um dos motivos que nunca me deixaram escrever opinião de ânimo leve é o gosto pela minha insignificância e anonimato. São das coisas que mais prezo nesta vida. Então porquê tentar impingir ou vender os meus pensamentos que não têm valor factual nem especifíco? Não sou perita em nada, não sei muito sobre nada, não sou extremamente boa em nada… então sobre o que posso opinar?
Passei-me! Disse-lhes: “This is not my fight, it is not my war. I shall not take part nor even a side. I don’t agree with the russian position the same way I don’t agree with the estonian one. My country did not participate in the II Wold War, so why should I be taking part on it’s consequences? When writing journalistic texts I shall not show emotion or opinion, and that is the only way I know how to write. My opinion is only mine. I don’t want to see it in the newspaper”!
Eu bem escrevi relatos sobre os motins, press releases sobre a situação do chavalo, e enviei-os para todos as agências noticioas que merecem o meu respeito. Não por iniciativa prórpia, obviamente, mas porque a Maia e o Igor me pediram. Mas ficam muito espantados quando ninguém pega nas minhas peças… devem achar que os editores de grandes fábricas de conteúdos não têm mais nada que fazer senão pegar em textos escritos por uma miúda que não é jornalista credenciada, que escreve quase sem fontes, numa língua que não é a sua e sem orientação e supervisão profissional… É óbvio que todos os órgãos de comunicação social do mundo, que escrevem internacional, têm os olhos postos em Tallinn, na mesma forma que cá têm um correspondente ou algumas fontes. Então porque precisariam de mim?? Nem os órgãos portugueses, que não tinham cá ninguém, se mostraram interessados nas minhas notícias… porque haveriam os outros de o fazer? Para mim isto é claro como água e de fácil compreensão. Mas para os chefes da minha organização é sinónimo de que eu não me esforço, não me importo, não quero saber… “You are a journalist and you have no questions”, disseram-me! Pois, eu bem vejo o que se passa à minha volta, não preciso de perguntar para perceber. E quando eles falam muito em russo e eu pergunto alguma coisa respondem-me com uma ou duas frases… Que a democracia e a liberdade de expressão, na Estónia, são coisas muito frágeis, eu já sei. Mas isso não quer dizer que o possa escrever só porque sim! Digamos que não me encontro na mais confortável posição para o fazer! Não tenho provas, não tenho fontes, só sei o que vejo e o que sinto na pele… e isso é opinião, não publicável!
Eu sei que a escola de jornalismo moscovita é muito diferente da anglo saxónica, seguida em Portugal, mas eu só fui treinada por uma e a minha mente não é assim tão aberta a mudanças… Não consigo mudar a favor do que vai contra os meus princípios! Consigo adaptar-me ao frio, à falta de beijinhos na cara, à pouca hospitalidade. Mas continuo a usar havaianas em casa, a dar beijinhos na cara dos meus amigos e a receber convidados com muito amor e carinho! Não sei se me faço entender a 100 %, mas acho que já me perceberam o suficiente.
Então estes dias têm sido assim… uns bem outros menos bem. Eu não sei se eles exigem demasiado de mim ou se eu é que não me dou o suficiente. Mas sinto que às vezes me querem usar como arma política… e num país onde os estrangeiros são olhados de ladeiro, é capaz de não ser muito boa ideia! Não gosto que me digam que não me importo, mas a verdade é que bem antes de fazer 18 anos me capacitei que não posso mudar o mundo… tenho muita pena!

Entretanto lá mudaram o monumento de sítio, do centro da cidade para um cemitéro militar, não muito longe. Dia 8 de Maio comemora-se em quase odo o mundo o fim da II Guerra Mundial. Na Rússia dia 9 de Maio é feriado, Dia da Vitória. Ou seja, aqui vai-se à missa e ao monumento, no dia 9. Pois muito bem. O meu plano era ir ao novo sítio do monumento, tirar umas fotos e seguir para a aula de russo. Qual não é o meu espanto quando a Maia me pergunta se eu não vou à igreja… Oh pah, não é preciso ser muito inteligente para entender que: se eu não percebo a língua dificilmente terei algum gozo em assistir a algo que é unicamente em russo. “I am not a religious person. I don’t go to the church in Portugal, so why should I go here?” Eles queriam que eu fosse à igreja e que engrossasse o cortejo de russos pela cidade, ostentando símbolos com dizeres do género: “I remember. I am proud”. Poupem-me… Quer dizer, não é que não me importe ou que não queira ver ou saber o que se passa. Mas definitivamente não quero ser parte do que se passa. À excepção das manifestações estudantis em Coimbra e Lisboa, eu fui sempre unica e exclusivamente uma espectadora. Nunca tive razão suficientemente forte que me levasse para o meio da confusão ou para a frente de batalha, além da estupidez das propinas. Porque é que haveria agora de meter-me entre dois povos que têm sérios problemas de relacionamento há várias décadas? Mas, claro que para a minha organização eu não me importo, não quero saber, não quero ser parte. Já me disseram que para o ano que vem querem um voluntário russo. Acho bem que queiram um falante, porque facilitaria imenso o trabalho com os miúdos e pode ser de uma grande mais-valia. Mas eu sei que, lá no fundo, eles querem é alguém que tome as suas dores e assuma uma luta que não é sua… Sinto muito, mas esse papel eu não farei!

8 comentários:

Bottled (em português, Botelho) disse...

Cara Liliana, ou miss lee, como preferir,

Reconhecidamente, os meus parabéns!

Lembre-se disto: o mundo é redondo, dá muitas voltas. E há o messenger, os e-mails, os blogs, os telefones, as velhinhas mas ainda tão eficientes cartas, às quais podemos juntar fotografias e lembranças, pelo que as distâncias, com a evolução natural das coisas, ficam cada vez mais curtas.

E, se queremos viver bem, à boa e velha maneira portuguesa, então temos de olhar para nós e não abdicar dos nossos princípios, respeitando os dos outros.

A saudade é um sentimento muito nosso, mas que os outros povos também já vão percebendo, porque é universal. E não se preocupe que, uma vez gravado no coração, um sentimento não muda nunca, a menos que o queiramos!

Este pobre embriagado compulsivo, a 4000 Km de distância, depois de ler este S. post, não poderia deixar de lhe dizer que a malta da aldeia faz questão de esclarecer que já a tinha nomeado nossa correspondente na Estónia, mas que isso não lhe alterou em nada a vida, apenas fez com que, cada vez mais, nos sentissemos solidários consigo e estivessemos constantemente a torcer (calma, Chefe, largue lá o pescoço do russo, não era torcer nesse sentido... deixe lá o pobre respirar...) para que tudo lhe corresse bem ao longo do caminho.

Afaste as pedras que inevitavelmente vai encontrar nessa jornada de vida, lembrando-se delas apenas o suficiente para extrair as devidas lições, e vai ver que as tristezas de hoje se transformarão nas alegrias de amanhã!

Please remember, just before getting drunk, that living is just as good as drinking a great wine. (Prof. Dr. Zé Porvinho, na sua tese de mestrado subordinada ao tema: "Um bom vinho a casa entorna", perdido algures numa página qualquer, com uma nódoa vínica ao canto).

Atentamente.

Hic Hic Hurra

portugalilainen disse...

Arre, chatos com'a putaça!

E tu também! Ah mulher determinada, viva!
Vai com calma... d'uma coisa eu tenho certeza (apesar de não te conhecer tão bem quanto isso), que recebes com muito carinho, isso recebes!

Beijos desde o círculo polar árctico

Mexicano em Praga disse...

Oh Leee!!!!!

Ai mae, como te percebo... O essencial e que mantenhas o carisma, mesmo que nao o queiras ter!
Joder, que mera isso do pessoal bazar... acho que e por isso que nao e aproximo muito. e assim sofro em antecipacao! ridiculo...
Beijoca

ENGº. Viriato disse...

Cara Miss Lee,
Deus escreve direito por linhas tortas: logo ai, onde há tantos problemas, há tanta Vodka à disposição. E ainda há quem não acredite na divina providência...
Cumprimentos

João Cão disse...

O conflito e´ o melhor sitio para um jornalista e onde doi mais a um homem.

beijos
joao

Rabodesaia disse...

Olá, já há uns tempos que ando a seguir o teu blog. Há uma ideia que fica, a ideia da multiculturalidade com que tu te enfrentas e que te dá gozo, mas ao mesmo tempo a tua busca de raízes no privado, como um árvore que suga a água do solo:
"Consigo adaptar-me ao frio, à falta de beijinhos na cara, à pouca hospitalidade. Mas continuo a usar havaianas em casa, a dar beijinhos na cara dos meus amigos e a receber convidados com muito amor e carinho!". Achei a frase brilhante!

Lampimampi disse...

oizeeeeeee

a cena do pessoal bazar as vezes tambem me preocupa! Mas nao ha nada a fazer, por isso toca a curtir ao maximo enquanto estao cá, que depois, como se diz lá pela terrinha, "depois é noite"! =p

Pois, ouvi que isso aí por tallin nao anda mt famoso...
=/

Cuida-te...
=P

Saudades
Beijoca grande

Lampimampi disse...

ah, e mais uma coisa (para ti e para o Birls)...

Nao se esquecam que depois de voltarmos a portugal (que é coisa que ainda nao estou certo de ter vontade de fazer...lolol) vamos ter outra cena tipo "pre departure training", que vai ser a puta da loucura total!
=D

iupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii
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